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Ficheiros obtidos pela “Der Spiegel” e partilhados com o consórcio EIC revelam os bastidores de como Messi passou a ganhar mais de €100 milhões por ano


Será um dia para não esquecer. Na vida dos comuns mortais, pelo menos na maioria das vezes, o amor e o dinheiro raramente coincidem, mas a data de 30 de junho de 2017 mostra como há sempre gente capaz de provar que essa lógica tem exceções extraordinárias. O dia em que Lionel Messi recebeu 260 convidados do mundo inteiro para assistirem ao seu casamento com a namorada de longa data na terra natal onde se conheceram, em Rosário, na Argentina, foi também o dia dos novos contratos de trabalho que o avançado estabeleceu com o Barcelona. E que o tornam, a uma grande distância de todos os outros, e apesar de já ter 30 anos, o jogador mais bem pago da história do futebol.

Documentos obtidos pela revista alemã “Der Spiegel” junto da plataforma Football Leaks, e partilhados com o consórcio EIC (European Investigative Collaborations), de que o Expresso faz parte, revelam agora como pela primeira vez um clube assegurou o pagamento de mais de 100 milhões de euros por ano a um futebolista.

Os bastidores sobre a negociação desses contratos estão expostos em centenas de e-mails internos do Barcelona, em extratos bancários e em outros documentos analisados pela “Der Spiegel” e por outros órgãos de comunicação parceiros do EIC, incluindo o “El Mundo” em Espanha e o Mediapart em França, pondo em causa até que ponto princípios como a moderação e a honestidade deixaram de ser tidos em conta quando a única coisa que conta no mundo do futebol é a guerra em torno das superestrelas como Lionel Messi, Cristiano Ronaldo ou Neymar. Ficar com elas ou perdê-las.

Em grande medida o salto estratosférico de salário deveu-se a um outro jogador com quem Leo tem feito a maior dupla do futebol mundial, embora só um deles ponha os pés na bola: Jorge Messi. Um é a cara do outro, pai e filho, e desde que chegaram juntos a Barcelona — quando Leo procurava, aos 13 anos, um tratamento para os seus problemas de crescimento — que andam a driblar no campo em que cada um se mexe melhor.

O pai tem sido o agente do filho e no novo acordo com os catalães conseguiu uma comissão de 5% só para si: 24 milhões de euros em quatro anos. Mas não se ficou por aí. Jorge fez com que seja o clube a assumir por inteiro os custos do lado mais sombrio de Messi: as fintas com que os seus assessores têm contornado o pagamento de impostos.

O clã Messi foi informado em abril de 2016 pelo Barcelona que as autoridades fiscais tinham aberto uma investigação sobre os pagamentos do clube à fundação do jogador (ler texto ao lado), pouco antes de, no verão desse ano, pai e filho terem sido condenados num outro processo por fraude fiscal.

Apesar de nesse primeiro processo terem escapado a uma sentença de prisão efetiva, os 4,1 milhões que os tribunais consideraram ter sido o valor com que os cofres do Estado foram defraudados entre 2007 e 2009 foram devolvidos a dobrar: além de cinco milhões pagos voluntariamente em 2013 para evitar males maiores, o clã viu serem-lhe aplicadas multas no valor de quatro milhões.

Nessa altura, com uma condenação no colo e um novo processo a ser cozinhado, um advogado especialista em questões fiscais avaliou a pedido do Barcelona como “muito elevado” o risco de pagamentos feitos pelo clube à Fundação Leo Messi entre 2010 e 2013 virem a ser considerados também como um crime, por alegadamente se tratarem de uma componente salarial camuflada como doação (e, portanto, isenta de imposto).

Para atenuar uma futura nova condenação, os Messi decidiram pagar 12 milhões de euros ao Estado, mais uma vez por antecipação. Mas a expensas do clube. Com o antigo contrato do jogador a expirar no verão de 2018 e o medo de deixar sair a sua maior estrela sem qualquer cláusula de rescisão, o Barcelona aceitou uma solução no mínimo eticamente questionável. “Por favor, mantenha-se do lado deles, depressa, garanta que tudo é feito como deve de ser”, escreveu o presidente do clube, Josep Maria Bartomeu, ao diretor da sua equipa jurídica.

Seguiu-se um malabarismo financeiro. O Barcelona emprestou 12 milhões de euros a Messi para o jogador saldar o assunto com o Estado. E, assim, os valores entregues em anos anteriores pelo clube à Fundação Leo Messi como doações — isto é, sem retenção de IRS — foram voluntariamente assumidos como pagamentos de salários.

Numa minuta de acordo entre ambas as partes ficou escrito: “Mesmo que o montante em causa seja pago formalmente pelo senhor Messi, esse valor será absorvido por inteiro pelo FC Barcelona”. Os catalães concordaram em pagar ao avançado argentino um bónus na época seguinte, 2016/2017, para fazer face a estas contrariedades com as finanças espanholas: 23,1 milhões de euros brutos; o equivalente a 12 milhões de euros líquidos.

Uma funcionária do Barça responsável pelo compliance — pela verificação de que tudo está de acordo com as regras — ainda levantou dúvidas sobre os contornos do empréstimo, mas não foram tidas em consideração. Os e-mails analisados pela “Der Spiegel” mostram como um dos diretores do clube pediu ao administrador financeiro para neutralizar a funcionária. “Este empréstimo pode ajudar a convencer Leo a estender o seu contrato. E se nós não fizermos isto, tudo pode ficar mais complicado (ou impossível).”

O administrador fez o que lhe pediram. Escreveu à funcionária: “Temos de ter consciência que este assunto está relacionado com o ativo mais importante do clube.” Será graças a Messi, explicou no e-mail, que poderão vir aí novos e importantes patrocínios.

O Barcelona é... Ele

Pouco depois do casamento de Messi, o diretor jurídico do Barcelona enviou um e-mail ao CEO do clube. “ALELUYAAAA”, estava escrito no campo do assunto. “Obrigados a todos pela vossa dedicação e esforço. A renovação de Leo Messi... foi importante para a sobrevivência do FC Barcelona.”

Ironicamente, o novo acordo não foi anunciado nessa altura. Os responsáveis do clube e o pai do jogador tinham assinado os contratos, mas faltava o próprio Messi desenhar o seu nome. O avançado foi adiando esse momento ao longo de meses, por causa de um pequena divergência em torno do valor da cláusula de rescisão. O Barça queria fixá-la em 300 milhões e anunciá-la aos fãs, mas Jorge Messi não estava interessado. Só em novembro Leo finalmente assinou o acordo. E a cláusula foi anunciada. Tinha passado para os 700 milhões de euros.

Os números são todos eles impressionantes. Nas quatro temporadas que faltam até 2021 a “pulga”, como é também conhecido o jogador, tem direito a receber 106.347.115 euros por ano, desde que se mantenha como uma das peças-chave da equipa. E no caso de o Barcelona conquistar tudo — a Liga, a Taça do Rei e a Liga dos Campeões — e Messi levar para casa o título de melhor do mundo, o pagamento sobe até aos 122.515.205 euros numa única temporada.


O bónus anual de 23,1 milhões de euros entretanto acordado no ano anterior para Leo fazer face aos seus problemas com o fisco, de acordo com os documentos, passaram a estar incluídos do seu novo salário fixo.

O grande rival de Cristiano Ronaldo passou a representar cerca de 40% de toda a massa salarial do clube catalão. Esses cálculos foram feitos no Barcelona e houve até quem comentasse com preocupação o tamanho do desnível: “O jogador tem de ter consciência o quão desproporcionado o seu salário é relativamente ao resto da equipa.” Pelos vistos, não a tem.

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O QUASE DO MESSI
Florentino Pérez sugeriu fretarem dois aviões e fecharem o acordo em pleno ar. Messi iria ganhar mais 35% do que o rival


A 22 de junho de 2013, o advogado espanhol de Lionel Messi, Iñigo Juárez, escreveu um e-mail a Jorge Messi, pai e agente do jogador. Boas notícias. Tinha-se encontrado com os patrões do Real Madrid. Messi renovara uns meses antes, em fevereiro de 2013, o seu contrato com o Barcelona, que agora incluía uma cláusula de rescisão de 250 milhões de euros, mas o Real Madrid estava disposto a cobrir esse valor. Queriam contratá-lo custasse o que custasse, de acordo com o que Juárez contou ao pai do avançado na troca de correspondência obtida pela “Der Spiegel” e partilhada com o consórcio EIC (European Investigative Collaborations), de que o Expresso faz parte. Os merengues tinham dispensado José Mourinho do cargo de treinador em maio e, com Carlo Ancelotti, estavam em fase de renovação.

Florentino Pérez, o presidente do clube, ofereceu a Messi uma média de 23,125 milhões de euros líquidos durante oito épocas, até 2021. Além disso, o argentino poderia ficar com todos os ganhos dos contratos de imagem assinados antes do verão de 2013, sem partilhar nada com o Real, o que significava mais 20 milhões de euros por época.

A proposta contrasta com o que viria a ser negociado dois meses e meio depois com Cristiano Ronaldo, quando o avançado português fechou a extensão do seu vínculo com o Real até 2018 a troco de 15 milhões de euros líquidos por ano, a acreditar no que foi divulgado na altura pela imprensa espanhola. Passou nesse momento a ser o jogador mais bem pago do mundo, mas, ainda assim, ficou a ganhar menos 35% do que tinha sido oferecido ao seu maior rival. “Sim, o dinheiro é importante, não vou mentir, mas não foi a prioridade”, disse Ronaldo na ocasião, quando oficializou o prolongamento do contrato numa cerimónia pública no Estádio Santiago Bernabéu ao lado de Pérez. No Real desde 2009, e até à altura eleito uma única vez como melhor jogador do mundo, Ronaldo estava bem atrás do currículo de Messi, que conquistara esse prémio quatro vezes seguidas, de 2009 a 2012.

ESCRITO NO CÉU

“Eles querem saber rapidamente o que se passa [do nosso lado]”, escreveu Juárez a Jorge Messi. “Estão dispostos a gastar o que for preciso pelo seu filho.” O Real impunha um prazo de quatro dias para fechar as negociações, uma condição dificultada pelo facto de os Messi estarem de férias.

Um plano de emergência foi sugerido por Madrid. O clube propunha fretar dois aviões privados para viabilizar uma reunião frente a frente entre as partes. O primeiro avião serviria para acolher a bordo os Messi e o seu advogado, mais Florentino Pérez, o diretor desportivo do Real e um especialista fiscal, munidos de uma proposta de contrato. As conversações seriam tidas no ar. Um outro jato iria depois apanhar o jogador e o pai aonde quer que tivessem aterrado para os devolver ao seu local de férias, enquanto Florentino Pérez regressaria a Madrid no primeiro avião.

De acordo com a correspondência analisada pela “Der Spiegel”, a generosidade mostrada pelos madridistas não se resumia ao jogador. Dariam uma comissão de 5% ao pai. Ao todo, 16 milhões em oito anos. E havia mais. Já era pública a existência de um inquérito-crime sobre suspeitas de evasão fiscal contra o avançado e talvez desse jeito uma ajuda nesse campo. “Eles disseram-me que estão a pressionar o Rajoy para se encontrar uma solução favorável para o seu filho”, escreveu Juárez. O advogado, no entanto, não considerou credível que o clube pudesse manobrar o primeiro-ministro espanhol.

Confrontado pela “Der Spiegel”, Juárez limitou-se a protestar contra a divulgação de e-mails internos, classificando-a como uma violação da lei, numa reação não muito diferente do próprio Real Madrid, que disse tratar-se de algo “absolutamente incorreto”.

Embora Leo tenha acabado por não ir para o Real, as negociações nos bastidores terão alavancado uma posição de força que levou a que o Barça voltasse a melhorar as condições do jogador logo no ano a seguir, em maio de 2014, subindo o seu salário fixo anual bruto para 29,9 milhões de euros, tendo em conta uma minuta de contrato a que o consórcio EIC teve acesso.

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